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O dia-a-dia em pequenas doses numa carta escrita para atravessar o Atlântico.
Estar desempregada ou estar a trabalhar numa segunda-feira é quase a mesma coisa. Em termos de sentimento, claro. Já nem uso a desculpa do ceú, de estar cinzento, de poder chover. Sou das poucas pessoas que devo gostar do Outono. Não faz mal. Habituei-me a ser das poucas pessoas em muita coisa. A verdade é que hoje é um dia chato. Sem grande energia. É segunda-feira. A manhã começa tão cedo, na estrada a seguir sempre os semáforos, e a olhar para os ponteiros do relógio. Elas não podem chegar atrasadas ao colégio. O caminho de regresso, com paragens obrigatórias porque é preciso inventar alguma coisa antes de me enfiar em casa. Mesmo que seja para ler e escrever, ler e escrever, etc e tal. Que tédio. Mas apenas porque é segunda-feira. Amanhã será melhor, penso sempre. Na minha cabeça e neste texto, eu posso ser tal como sou. E escrever livremente. Até a madrinha me dizia “olha, para ocupares o tempo faz o que sempre gostaste: escreve”. Eu penso na idade dela. De como ela me viu pequenina, com meses… de como ela e eu falamos, hoje, ao telefone, separadas pelos 300km de distância. E ela lembra-se disso. De mim sempre agarrada aos cadernos, com os livros atrás, a escrever cartinhas para as melhores amigas. É por isso que voltei a tudo isso. Aos cadernos, às cartas também. Quando estacionei o carro junto ao colégio, a Joana preparava-se para uma espécie de birra. Queria que a fosse buscar às 16h00. Mas eu só vou buscá-la às 16h30. A diferença é tão pouca, mas dou por mim a dizer num tom mais rígido: “A mãe também tem vida”. Às vezes, as verdades saem, assim, à bruta. Eu posso estar desempregada, hoje, mas continuo a ser tão válida como qualquer outra pessoa. Se calhar, preciso de me mentalizar disso mesmo: que a vida continua, mesmo quando continua de uma forma diferente, quando a profissão que sempre adorámos ficou lá atrás…
“O meu nome é Ana Cunha Almeida. Hoje é segunda-feira e eu estou aborrecida”.
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